Recorda-se como se fosse hoje. Ainda olha para trás, por cima do ombro, todos os dias. A mesma rua cinzenta. A chuva aviva-lhe a memória. Faz sempre questão de deixar as primeiras gotas caírem-lhe no rosto. Ouve os seus próprios passos enquanto caminha. Não os conta, apenas os escuta em silêncio. Às vezes questiona-se quantos passos já terão passado. Ida ou volta pouco importa. As manhãs, as tardes ou as noites são-lhe indiferentes ao olhar frio. Caminha sozinha, como se a rua estivesse deserta. Ignora os vidros, os postes, tudo o que encontra pelo caminho é como se lá não estivesse. Caminha lentamente, de mãos nos bolsos do casaco comprido. De mãos fechadas, agarrando o nada. Ouve nos seus passos o passado, a ridicularidade do vazio do passado. Sente frio e questiona-se se o Inverno estará a começar ou acabar. "Pouco importa." É ali, na breve linha que separa a sanidade da loucura, que se sente bem. O mundo é seu, o seu mundo. De que vale contar aquilo que ninguém entende? De que vale ouvir sobre o que não vivemos? Continua a olhar por cima do ombro todos os dias. Na eterna esperança de encontrar a resposta a todas as suas questões. Um dia... um dia.
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