Poucos permaneceram fiéis à instituição em que depositaram toda a sua confiança e na qual sentiram na pele o desespero e a incerteza perante o futuro. No rescaldo de mais uma polémica sobre a demissão da direcção da Universidade Independente, os resistentes encontraram razões para ficar e esperam que o tempo apague as marcas do passado.
Ao entrar pela porta principal da Universidade Independente, as primeiras imagens que cruzam o pensamento do mais comum cidadão são as que todas as noites, por largas semanas, nos chegavam através do ecrã de televisão. Imagens de caos, de alunos desesperados e sem saber que atitude tomar.
Com o passar do tempo, muitos desses alunos decidiram abandonar a instituição, e neste momento, ao atravessar o hall e seguindo pelos corredores, conseguimos apenas imaginar a quantidade de estudantes com quem nos poderíamos cruzar, atrasados para uma qualquer aula, de passagem para o bar, discutindo matéria com outros colegas. Encontramos apenas alguns.
No bar, que antes acolhia dezenas de alunos, o ambiente é calmo. Anabela Rodrigues (nome fictício), 24 anos, no 2º ano do curso de Psicologia, faz questão de nos apresentar uma visão diferente dos acontecimentos, de alguém que a meio do curso viu o seu futuro ameaçado mas decidiu ficar.
O início do pesadelo
Para a maioria dos alunos, nada fazia prever o dia 26 de Fevereiro, o dia que Anabela considera ter sido aquele em que realmente se apercebeu da gravidade da situação. «Para além de já estar à espera, fiquei surpresa, nunca pensei que fosse tão grave.»
A universidade havia então suspendido o início do segundo semestre por uma semana na sequência do afastamento do vice-reitor Rui Verde e de outros membros da direcção e conselho geral da SIDES (Sociedade Independente para o Desenvolvimento do Ensino Superior), entidade gestora da universidade.
Os acontecimentos sucederam-se, levando a universidade a merecer abertura da emissão de telejornais e ao início de um processo de reavaliação do ensino superior privado, enquanto os alunos assistiam sem nada poder fazer. «Foi uma situação desgastante, primeiro porque só pensava na UnI, não conseguia sequer dormir… e depois porque todos os que estavam de fora perguntavam e tinham curiosidade sobre o que se estava a passar», confessa Anabela, visivelmente emocionada. Na sua opinião, os únicos que merecem o seu respeito pelo acompanhamento aos alunos durante esta fase crítica são «os professores, que mesmo não sendo pagos não nos abandonaram. A UnI não nos apoiou».
A maioria dos professores, independentemente da sua situação ou relação com a universidade, decidiu também permanecer e apoiar os alunos. «O que se passou não põe em causa a qualidade e profissionalismo dos professores.» Na convicta opinião de Anabela o ensino na Universidade Independente é tão bom como em qualquer outra universidade do país.
Quanto às decisões do Ministro Mariano Gago, a aluna considera que este se «precipitou ao dar início ao processo de encerramento compulsivo da UnI. A situação devia ter sido inspeccionada mais cedo e não a meio do ano lectivo, uma vez que prejudicou os alunos». O aroma a café parece tranquilizá-la.
Mudar para pior – não, obrigado
«Neste momento as aulas estão a ser normais, temos testes, trabalhos e frequências. No meu caso não tenho motivo para mudar», afirma Anabela, que se diz satisfeita com a actual situação académica na Independente. No entanto, concorda que os alunos deveriam ser de alguma forma compensados pelos dois meses (Fevereiro e Março) em que não tiveram aulas.
Nessa fase muitos alunos decidiram abandonar a instituição, transferindo-se para outras universidades, mais convenientes de acordo com o curso de cada um. Esta aluna, no entanto, considera que «as outras universidades prometeram as condições necessárias à transferência e até acompanhamento especial para os alunos, mas nos casos que conheço isso não se veio a verificar, para além de não ir conseguir equivalências de tudo o que fiz até agora.»
Neste momento, a bonança após a tempestade, alguns alunos regressam à UnI enquanto a instituição declara abertas as inscrições para o próximo ano lectivo.
Futuro incerto
A maior preocupação dos actuais alunos da universidade parece mesmo ser o futuro. A poucos passos do final do ano lectivo ainda são muitas as incertezas: «não faço ideia se teremos acesso a exames ou não», confessa Anabela. «Tenho esperança que até ao final do ano tudo se resolva.»
Apesar dos riscos, os alunos que decidiram apostar e permanecer na universidade, têm ainda o futuro profissional comprometido pela credibilidade da instituição. «Os principais culpados foram a reitoria e a SIDES, mas a abordagem do assunto pela comunicação social veio denegrir a imagem da UnI e isso vai ser um factor negativo uma vez no mercado de trabalho.»
O envolvimento do primeiro-ministro é, na opinião da aluna, o factor mais prejudicial: «estão a tentar fechar a UnI para proteger o primeiro-ministro, se nós não somos reconhecidos ele também não será».
Segundo informações de fontes ligadas à universidade, a SIDES vai extinguir-se, alegando falência, dando lugar a uma nova empresa gestora, inspirando confiança aos alunos que se queiram inscrever no ano lectivo 2007/2008 para iniciar ou finalizar o seu curso. Anabela, como deixou claro, vai inscrever-se.
REPORTAGEM POR:
RAQUEL SANTOS
CRONOLOGIA DOS PRINCIPAIS
ACONTECIMENTOS NO CASO UNI
26 Fevereiro – A UnI suspende o início do segundo semestre na sequência do afastamento de Rui Verde e membros da SIDES por parte do reitor Luís Arouca.
27 Fevereiro – Amadeu Lima Carvalho garante ser o principal accionista da instituição, com 67,5% das acções, numa altura em que decorre uma batalha jurídica pelo controlo do estabelecimento. O ministro do Ensino Superior Mariano Gago, ordena a intervenção da Inspecção-Geral do Ministério para determinar se mantém o reconhecimento da UnI.
2 Março – A nova equipa de vice-reitores da UnI integra o antigo secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares e deputado do PSD Montalvão Machado, o cientista Carvalho Rodrigues e Joaquim Reis.
5 Março – O nome de Pedro Santana Lopes é retirado da lista de professores da Faculdade de Direito da UnI. Este alega nunca ter sido convidado a fazer parte da mesma.
22 Março – Rui Verde é detido para ser interrogado no Tribunal de Instrução Criminal (TIC) de Lisboa.
28 Março – Luís Arouca e Amadeu Lima Carvalho, já constituídos arguidos, encontram-se no TIC de Lisboa para serem interrogados.
29 Março – Mariano Gago, determina o início de um processo de encerramento compulsivo da UnI por "manifesta degradação pedagógica".
4 Abril – Lúcio Pimentel, alegado presidente da SIDES, apresenta formalmente a nova equipa reitoral, presidida por Jorge Roberto e composta pelos vice-reitores Carvalho Rodrigues, Raul Cunha e Rodrigo Santiago.
5 Abril – Um estudo do Observatório de Ciência e Ensino Superior revela que não houve diplomados no curso de 1996 que José Sócrates frequentou na UnI. A UnI revela que vai entregar ao Ministério do Ensino Superior a documentação comprovativa da viabilidade financeira da instituição.
9 Abril – Caixa Geral de Depósitos concede uma licença sem vencimento ao seu funcionário Jorge Roberto para que este exerça o cargo de reitor da UnI.
23 Abril – UnI acusa a Inspecção-Geral do Ensino Superior de parcialidade na investigação.
30 Abril – Procuradoria-Geral da República manda abrir uma investigação à UnI.
08 Maio – Mariano Gago emite um despacho no qual retira à UnI o reconhecimento do estatuto de instituição de interesse público.
29 Maio – UnI entrega ao Ministério do Ensino Superior a contestação ao despacho que retira à instituição o reconhecimento de interesse público.
11 Junho – A juíza Isabel Ferraz Pinto de Magalhães, ex-mulher do antigo vice-reitor da UnI Rui Verde, é constituída arguida no caso da UnI e a sua residência é alvo de buscas.
12 Junho – Certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa confirma que a SIDES renunciou às suas funções a 26 de Abril.
1 comentário:
Mesmo à jornalista =)
clap clap clap **
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